Cláudio Messias*
Exatamente 730 dias depois de tomar a segunda, em então 42
anos de vida, decisão que me levaria a uma completa reeducação alimentar, cá
estou, dois anos depois, publicando mais uma seção, no Blog, a que denomino
Medida Incerta. Incerta por não ter compromisso com metas, nem orientações
formais para aquilo que devo fazer ou comer. Busquei conhecimento mediante
consultas médicas e navegação pela internet, e atribuí responsabilidade
exclusiva a uma pessoa: o cidadão Cláudio Messias. Esse que vos escreve.
Em abril de 2012 eu me preparava para viajar a
Florianópolis, onde prestei concurso na universidade estadual de lá (UDESC).
Fiquei uma semana na Praia do Sonho, em Palhoça, onde meu primo, Ilonso Sussel,
tem, com a família, casa e restaurante. Não foi naquela vez que assumi cargo
efetivo docente em universidade pública, mas a parada de 5 dias em uma
desértica praia já sem o caloroso movimento do verão serviu de inspiração para
algumas revisões sobre minha vida. Precisava, pois, equilibrar corpo e mente.
No janeiro anterior eu havia passado pela tradicional
bateria de exames a que me submeto todo início de ano. Na passagem pelo
Centrocor, em consulta com o amigo e competente cardiologista Marcos Elias
Nicolau, pesagem e aferimento da pressão arterial antes de entrar na consulta.
Pressão na casa dos 14 por 9 e o peso de 105 quilos (com roupa, pois a partir
dali passei a pesar, no clube, sem roupa e a balança marcava 104 kg). Exames de
sangue pedidos e feitos, ecocardiograma daqui, eletrocardiograma dali, esteira,
bicicleta e, enfim, a constatação. O coração continuava em ordem, mas a pressão
arterial, no limite e os elementos sanguíneos, idem, indicavam que providências
precisavam ser tomadas.
Quem já leu minhas postagens anteriores no Medida Incerta
está confirmando que, sim, quem passa dos 40 anos de idade repete as mesmas
histórias e não se dá conta. Finjamos que não me dei conta disso, pois é
necessário ratificar, aqui, essa trajetória de dois anos. Digo isso porque
muitas pessoas têm lido minhas postagens e enviado comentários ou e-mails
dizendo terem-se identificado com minha realidade e, o que é melhor,
sentindo-se estimuladas a fazer o mesmo. É a comprovação de que qualquer um, a
qualquer momento, pode mudar seus hábitos e, sem pressa, colher resultados.
Basta saber o que vai começar, planejar os caminhos que percorrerá e, desde, já
saber exatamente onde quer chegar, seja em peso, em composição sanguínea ou
densidade de atividades físicas. Sim, claro. Não há resultado algum sem que as
atividades físicas sejam agregadas ao cotidiano.
Naquela semana que passei na catarinense Praia do Sonho
fiquei todos os dias sem consumir carne vermelha, uma vez que adaptei-me à
rotina da família que acolheu-me, fartamente adepta de peixe no cardápio. Já
tinha decidido que, retornando a Assis, iniciaria essa mudança gradativa e ao
mesmo tempo drástica na minha postura cotidiana, começando pela alimentação.
Mas foi lá, na orla da praia, que perguntei-me, logo no segundo dia, por que
não começar minha mudança exatamente ali. Fiz, durante cinco dias, caminhadas
desde a Ponta do Papagaio até a Ponta da Pinheira, em ida e volta, percurso que
deve ter, no total, uns 7 km, ou até mais. Com refeição à base de peixe e
saladas, senti a diferença no metabolismo antes mesmo da viagem de retorno a
Assis. Intestino funcionando perfeitamente e as refeições sendo feitas em
intervalos menores, em porções igualmente reduzidas.
Cheguei de volta à minha casa, em Assis, com mais de um
quilo a menos naquela ocasião. Eu e Rozana, a esposa, compramos uma dessas
balanças digitais caseiras e passamos a nos monitorar. Ela, mais sedentária,
não é muito adepta de atividades físicas, ao contrário de mim, que durante toda
a vida pratiquei esportes, só que sem regularidade. Relembrei, na ocasião, a
conversa que havia tido com Marcos Elias Nicolau, o cardiologista, meses antes.
Havia uma ordem e não uma recomendação de (i) perder peso, (ii) adequar a
alimentação e (iii) iniciar atividades físicas, caso realmente eu quisesse
chegar, vivo, à idade que meu tinha naquele 2012, ou seja, 71 anos. Hoje, meu
velho está prestes a comemorar saudáveis 73 anos.
O caminho percorrido nesses 24 meses está fartamente
relatado nas postagens anteriores, que constam no acervo desse Blog. Costumo
dar um panorama sobre meu peso a cada dois meses, não muito regular nesse
controle periódico. Tive, sim, períodos de relaxamento, em que, especialmente
nas férias de final de ano, voltei a ganhar peso. Sempre, contudo, com
entusiasmo para logo em seguida retomar o controle e dar sequência à meta de,
daqui exatamente um ano, em abril de 2015, atingir o limite de 88 quilos, pelo
que tinha quando casei, em 1994. A estratégia de marcar minhas consultas com
Marcos Elias Nicolau nos meses iniciais de cada ano favorece para esse reenquadramento
de postura.
E se eu pesava 104 quilos, afora roupas, em abril de 2012,
hoje, dois anos depois, estou pesando 91 quilos. Precisamente, a balança que
comprei semana passada marcava, no início da manhã dessa segunda-feira, 91,3
kg. A realidade cotidiana, minha, é outra. Se 24 meses atrás eu iniciava a
reeducação alimentar e de postura física na expectativa de trocar Assis por
Florianópolis, hoje vejo-me tendo trocado Assis por Campina Grande, na Paraíba,
onde na semana passada assumi cargo docente efetivo na Universidade Federal.
Quinze dias aqui, no Nordeste, e uma necessidade de nova adaptação, agora ao
cardápio e à rotina totalmente diferente daquela que levava em Assis.
Nem tudo, porém, aconteceu conforme o programado nesses dois
anos. Ou, ao menos, conforme o imaginado. Queria, eu, chegar nesse abril de
2014 abaixo da marca dos 90 quilos. Isso quase foi possível, mas a
instabilidade que marcou minha rotina de janeiro passado para cá provocou
alguns desequilíbrios. Não contrariando meu próprio discurso, porém, não encano
com marcas e números não atingidos. Isso evita que seja gerada frustração ou
tipos de decepção que, comuns em dietas tidas milagrosas, acabam desestimulando
o adepto e implicando no conhecido efeito sanfona. O gráfico demonstrativo de
peso nesses dois anos, publicado ao final desse texto, sinaliza bem o quão
oscilante foi a marca de minhas balanças no período referido.
Estou pouco mais de 1 kg acima daquilo que imaginava chegar
agora. Creio que metade desse peso a mais esteja relacionada à estagnação de
atividades físicas a que fiquei submetido em Campina Grande nos primeiros 10
dias desde a chegada. Minha prioridade, além de formalizar a burocrática posse
na UFCG, era encontrar um apartamento para alugar e iniciar a estruturação de
minha vida pessoal cá, no maior polo tecnológico do Nordeste, a capital do São
João. Cumprido, em partes, isso, tracei estratégia para minhas
caminhadas-corridas matinais e inicie busca por lugares onde possa praticar
atividades físicas na água. Ou seja, reproduzir em Campina Grande a rotina de
práticas esportivas que caracterizou meus últimos 24 meses em Assis.
Durante mais de uma semana fiquei submetido a refeições de
restaurantes. Não bastasse a culinária típica ser totalmente diferente, os
pratos têm concentração de gordura e sal muito além do que meu paladar passou a
tolerar desde que adotei a reeducação alimentar. Isso só foi resolvido na
semana passada, quando passei a cozinhar meu próprio almoço e, assim, voltei a
reduzir ao mínimo as porções de gordura animal-vegetal, sal e açúcar. Senti, em
questão de dias, a diferença no meu próprio metabolismo. Não ganhei muito peso
nesse período de exceção, mas minha pressão arterial, que monitoro em casa, deu
alguns pequenos saltos. Tudo, agora, equilibrado.
Minha rotina, hoje, é de um despertar mais cedo do que
costumava fazer em Assis. Se na Sucupira do Vale o meu despertar acontecia às
6h20, para preparar o envio dos filhos ao colégio, aqui em Campina Grande, pelo
fato de a Paraíba ser um dos estados brasileiros a compor o extremo leste da
América do Sul, o sol nasce por volta das 5 horas. Não consigo despertar depois
disso e, assim, pulo da cama antes das 6h00. Meia hora depois estou a caminho
do Açude Velho, em percurso de 20 minutos de caminhada. Naquele espaço público
campinense dou duas voltas no entorno da lâmina d’água, o que soma mais 45
minutos. O retorno, de mais 20 minutos, já é feito de forma moderada, sem
forçar, uma vez que subo uma ladeira considerável.
No apartamento chupo algumas laranjas que, preciso relatar,
são deliciosamente doces. Vêm, segundo explicou-me seo Chico, do Mercadão de
Campina Grande, a duas quadras de meu lar, de plantações da Bahia, nos
arredores do Rio São Francisco. Não confundir com laranja da variedade
“baiana”. Tem dia que chupo 4, tem dia que consumo mais do que esse número de
laranjas, dependendo da sede com que retorno das caminhadas. Feito isso, ajeito
minhas coisas e, meia hora depois, tomo um café da manhã que também consigo
manter igual ao que havia colocado na rotina em Assis. Digo isso porque, depois
de frustradas peregrinações por supermercados e hiper centers de Campina enfim
encontrei, nas lojas Americanas, as torradas da linha Magic Toast, da Marilan,
que, saborosas, têm baixíssimo teor calórico. Assim, meu café tem torradas,
requeijão e café preto feito com açúcar light.
Meus almoços seguem a composição de arroz e feijão
preparados com óleo de canola e pouco sal. Além de salada, acompanhamento com
carne cozida. Mesclo frango com peixe, favorecido pelo fato de a proximidade
com o mar paraibano, pernambucano, cearense e potiguar proporcionar preços mais
convidativos. Resisto no preparo de carne vermelha, mais cara, aqui, do que em
Assis. Igual restrição guardo à carne-de-sol, que mesmo preparada assada contém
alto teor de gordura e tem no sódio o seu fator de conserva. Para beber,
impossível não aderir ao suco de goiaba, servido na maioria dos restaurantes
por onde passei.
No restante do dia, lanche por volta das 17 horas.
Tradicional que sou, não resisto a um café com leite com bolacha do tipo
“maria” juntada, em bloco, com a mediação de margarina. Trago esse costume
desde a época em que lanchava na casa de minhas avós materna e paterna. Mania
que passa de pai para filho, pois meus dois rapazes volta e meia são vistos
fazendo o mesmo com as bolachas em seus lanches vespertinos ou noturno.
É sob esse controle alimentar, acompanhado por rotina de
atividades físicas, que chego ao dia 15 de abril completando exatos dois anos
de reeducação integral na postura alimentícia e corporal. Calças, cuecas,
bermudas e, agora, camisetas estão ficando para trás. O que vestia GG ficou
jeca e encontra-se guardado no armário, lá no fundo, sem uso. E do final do ano
passado para cá a medida G também começa a sobrar no corpo. Principalmente as
camisetas G ficam mais folgadas no abdômen, cujas medidas foram reduzidas de
117 cm para 101 cm. De barriga saliente o mesmo abdômen volta a ganhar o
desenho que tinha antes, o que soa estranho para uma pessoa que por vinte anos
não via outro peso na balança que não fosse na marca acima dos 98 quilos.
A bateria de exames que tive de fazer para ingressar no
corpo docente efetivo da Universidade Federal de Campina Grande comprovou o
quão bem está minha saúde. Fatores sanguíneos como triglicérides, colesterol
bom e ruim e diabetes encontram-se abaixo dos patamares considerados de limite.
E a pressão arterial há muito não sai dos 12 por 7. O resultado de tudo isso
são noites de sono totalmente controladas, de maneira que, como desperto por volta
das 5h00, não mais que 22h00 eu já esteja recolhendo o time de campo. Claro,
favorecido pelo fato de, estando sozinho em Campina Grande, não ter o
monitoramento permanente que mantinha, em casa, sobre os dois jovens filhos.
Acredito que daqui a um ano, quando completar o período
traçado para a minha completa reeducação alimentar e física, terei sustentado
esse conjunto de fatores positivos que, hoje, tamanha sensação de bem estar
proporciona. Sono controlado, disposição física para as atividades rotineiras,
entusiasmo maior para os desafios profissionais e de pesquisa e uma suficiência
de controle sobre as adversidades são apenas alguns dos elementos que,
positivos, pesam fortemente a favor da continuidade do projeto de vida que
tracei. Com 88 quilos ou menos terei minha saúde sob controle e um entusiasmo
maior para repetir a trajetória salubre de meu pai e parentes mais velhos, cujo
passado de várias décadas mostra rotinas sem vícios e libertas de exageros.
Como lema próprio construí, nesses 24 meses passados, o
ponto de vista de que alimentar-se indevida e exageradamente e, ainda por cima,
privar-se das atividades físicas é incondizente com a principal qualidade da
espécie humana, que a diferencia das demais. Não podemos, a meu ver, ser
inteligentes o suficiente ao nos percebermos acima do peso e imersos em uma
rotina com escassez de atividades físicas. Quando obeso, eu não tinha qualidade
de vida. E aquilo gerava uma sensação de frustração que, penso, fechava-me em
um universo de leitura do meu próprio eu que submetia-me a um auto-olhar de
incapacidade. Eu era infeliz comigo mesmo e, pior, sabia daquilo. E reconheço
que para sair desse universo nebuloso da baixa autoestima muitas vezes é
necessário recorrer ao auxílio da psicologia ou mesmo da psiquiatria. Atingir o
equilíbrio, portanto, muitas vezes depende de estímulo externo.
*Professor universitário, historiador e jornalista, é mestre
e doutorando em Ciências da Comunicação pela ECA-USP.
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