terça-feira, 15 de setembro de 2015

BAIXARIA - Prefeito de Prudente hostiliza arbitragem após empate com Assisense e Grêmio vai parar no TJD

Cláudio Messias*

Havia uma razão para o não lançamento da súmula do jogo Grêmio Prudente 1x1 Atlético Assisense, realizado no sábado à tarde. Os relatos das ocorrências do confronto foram tornados públicos somente nessa segunda-feira, em com uma novidade: diretamente no TJD. É para lá, no território do tribunal, que foi parar mais uma cena protagonizada pelo prefeito de Presidente Prudente, Milton Carlos de Mello, conhecido por Tupã, homonimamente à sua cidade natal.

Um verdadeiro teatro de horrores foi protagonizado no pós-jogo que barrou a reação do Grêmio Prudente na Segunda Fase da Segundona 2015. Vindo de terceira troca de treinadores na temporada e com séria ameaça de, novamente, ver morrer na praia as esperanças de chegar à Série A-3, o time prudentino foi envolvido em um imbróglio sem precedentes ao menos na jornada atual da Segunda Divisão. É bom que se ressalte, porém, que os relatos em súmula constam de narrativa unilateral das circunstâncias, de acordo com ponto de vista do árbitro Magno de Sousa Lima Neto, sem direito a versão, igualmente formal, do outro lado envolvido e-ou acusado.

O epicentro do verdadeiro terremoto que incidiu sobre o estádio Prudentão após o jogo de sábado envolveu uma suposta ação do árbitro assistente Rafael César Fernandes. Curioso é que ele despertou a ira do prefeito de Presidente Prudente, mas passou praticamente despercebido da crítica tanto de cronistas esportivos daquela cidade, quanto dos próprios atletas do Grêmio. Todos, após fechados os 98 minutos de bola rolando - recorde da Segundona 2015 -, lamentaram o gol sofrido aos 48 minutos finais, ou seja, nos acréscimos, fruto de desatenção dentro de campo, e em momento algum apareceu qualquer crítica diretamente ao trabalho da arbitragem.

Mas, Tupã, o prefeito, viu na ação de Rafael Fernandes o motivo principal do empate com sabor de derrota do Grêmio Prudente. Relata o árbitro Magno de Sousa Lima Neto que Tupã dirigiu-se ao vestiário da arbitragem, após o jogo, e postado à frente da porta, que encontrava-se aberta, soltou um enredo de palavrões e acusações que, caso procedam, remetem a um desequilíbrio emocional incompatível com a função de um representante eleito com o voto popular para o exercício de gestão de uma cidade da importância de Presidente Prudente. A variedade de repertório de xingamentos e ofensas é tamanha que o blogueiro, em vez de descrevê-la, opta transcrevê-las, na íntegra do que está registrado na súmula. E como esse tipo de documento está disponibilizado para acesso público, a íntegra representa que não serão omitidos, em grafia, os palavrões proferidos e, de acordo com o árbitro do jogo, atribuídos ao prefeito Tupã. Segue:

"Ao término da partida o prefeito da cidade de Presidente Prudente se dirigiu ao vestiário da arbitragem e parado de frente à porta do vestiário que estava aberta proferiu as seguintes palavras: " Eu quero falar com o bosta do assistente Rafael que jogou o projeto de uma cidade no lixo, e não vou sair daqui sem falar com esse bosta, porque eu sou o prefeito da cidade e ele não pode vir aqui e fazer o que ele fez e sair como se nada tivesse acontecido, são pessoas como vocês que afundam o futebol, por isso que a federação paulista está do jeito que está, eu sou inimigo declarado da federação paulista de futebol e pode falar lá que vou que sou oposição ao Marco Polo Del Nero que está acabando com o futebol do interior", neste momento eu me dirigi à porta do vestiário, e o avisei que iria fechá-la para continuarmos realizando o nosso trabalho. Ao deixarmos o vestiário da arbitragem e nos dirigirmos ao estacionamento para pegar o carro da FPF, e durante todo este trajeto o prefeito da cidade Sr. Milton Carlos de Mello, vulgo "Tupã", juntamente com o seu filho e o presidente do Grêmio Prudente, Sr. José Bueno Fernandes Neto, provocavam e insultavam o assistente nro 2 Sr. Rafael César Fernandes, onde o prefeito proferiu as seguintes palavras: "Ta contente...ta contente, seu vagabundo, sem vergonha, filha de uma puta, você tinha que ter vergonha na sua cara pra poder fazer isso seu filho da puta, seu filho nasceu esse ano e você tinha que ter vergonha de ser ladrão deste jeito seu cuzão, seu bosta, vagabundo, você é um bundão e seu nome já está na mão do Reinaldo, sabe porque, porque você acabou com o projeto de uma cidade, seu bosta, seu merda", enquanto isso o filho do prefeito proferia as seguintes palavras em posse de um celular em suas mãos "Você vai morrer seu filho da puta, estou vendo aqui seu filho de uma puta covarde, que você tem filho e tem esposa, teve filho agora né seu cuzao, você não merece ter filho e ter esposa seu ladrão, você é um bosta, volta pra sua casa agora desse jeito seu filha da puta, seu filho não merecia ter nascido de você e sua mulher deve estar com outro agora seu bosta", e o presidente do clube também se dirigindo ao assistente nro 2 proferia as seguintes palavras: "Você já veio aqui mal intencionados seu vagabundo, já liguei para o Reinaldo e o Cel. Marinho pra falar da merda que você fez aqui hoje, você ta deixando 50 pessoas desempregadas seu cuzão, e o Cel. Marinho vai até Santos no Jabaquara e não tem coragem de vir aqui". Ao colocar as malas no porta-malas do carro da FPF que conduzia a equipe de arbitragem o prefeito continuou com as ofensas ao Sr. Rafael Cesar Fernandes, falando muito próximo ao seu rosto com o dedo em riste proferia as seguintes palavras "Seu bosta, seu bosta, seu monte de merda, você acabou com o projeto de uma cidade, seu monte de merda", quando o assistente já estava dentro do carro ele tentou forçosamente abrir a porta que estava travada, proferindo as seguintes palavras "Você não é machão, sai aqui fora seu machão, bundão do caralho, você acabou com o projeto seu monte de bosta, filho da puta", foi no momento que entrei dentro do carro e saímos do estádio. Relato ainda que durante todo o assédio do prefeito, do seu filho e do presidente do Grêmio Prudente ao Sr. Rafael César Fernandes, não revidou com palavras ou gestos, se mantendo todo o tempo em silêncio durante as agressões verbais recebidas e o policiamento atuou de forma muito passiva não contendo em nenhum momento a ação dos mesmos."

Confira, a seguir, link com a íntegra da súmula, lançada no site da Federação Paulista de Futebol às 10h29 dessa segunda-feira, dia 14: Clique aqui

Alguns pontos desse relato, em súmula, chamam atenção. Quem é do exercício do jornalismo ou tem em sua práxis profissional a reprodução de excertos ou parte de enunciados de outrem sabe, e bem, o quão difícil é assimilar e guardar, com detalhes, falas completas tão longas quanto as registradas ao final do empate Grêmio Prudente 1x1 Atlético Assisense. Logo, a reprodução fiel ao que foi proferido fica comprometida, o que em nada reduz ou atenua a interferência, truculenta, do prefeito de uma cidade contra uma equipe de arbitragem de torneio profissional (nem que fosse futebol varziano ou amador esse comportamento se justificaria). Tamanho volume de detalhes em fala seria fidelizado com eventual gravação de áudio, o que não aparece em súmula.

Outro fator que chama atenção é o fato de, na própria súmula, o árbitro Magno Neto relatar que as ofensas começaram nos vestiários e, depois, tiveram desdobramentos no estacionamento do estádio, já no veículo utilizado para deslocamento ao jogo. Evidente, pois, que a súmula não foi preenchida nem lançada, online, nas instalações do estádio, como via de regra ocorre. Em casos como o de sábado, a impossibilidade de lançamento da súmula, via internet, deve ser justificada no próprio documento. E não há essa justificativa na súmula, apesar de o motivo estar indiretamente, ou seja, subjetivamente exposto e de conhecimento público.

Evidente, também, que a súmula foi preenchida tempo suficiente, depois, para a construção dos enunciados, que são longos e precisos. Ao ponto de somente no final, na última linha, ser observado que o policiamento militar, apesar da seriedade das supostas agressões verbais, nada ter feito para impedir os desdobramentos relatados.

Como as acusações feitas pela arbitragem recaem sobre o prefeito Tupã e seu filho, José Bueno Fernandes Neto, presidente do Grêmio Prudente, a representação no TJD tende a incidir sobre o clube, que passa a ficar exposto a punições ainda a serem conhecidas em citação cuja divulgação pode ocorrer ainda nessa semana. Nada, contudo, ao menos preliminarmente, relacionado a perda de pontos ou prejuízos na atual classificação do time, atual quarto colocado no Grupo 5.

* Professor universitário, historiador e jornalista, é mestre e doutorando em Ciências da Comunicação pela ECA-USP.

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