25 Março 2013
As seleções de Brasil e Rússia entraram no gramado para
reconhecimento, e lá estavam os russos se aquecendo. As duas seleções entraram
oficialmente no gramado para a execução dos hinos, troca de flâmulas e escolha
do cara-ou-coroa, e lá estavam os russos aquecendo. Execução dos dois hinos
nacionais, brasileiros cantavam, russos aqueciam. Acertos finais do árbitro
inglês e lá estavam os russos, aquecendo.
Começa o jogo e os russos saem atrás da bola com uma fome
que surpreendeu a todos. Me fez lembrar aqueles desafios de boxe em ringues
improvisados, em que um dos adversários parte para cima do outro no sufoco. A
Seleção de Felipão mal conseguia ver a cor dos olhos dos adversários russos.
Era pancada para todos os lados, e na bola. Tanto que o time mais faltoso
trajava camisas amarelas. E a bola praticamente não saía da defesa brasileira
nos 20 minutos iniciais.
Não, dessa vez não houve culpados. Claro, os russos não
conseguiriam manter o mesmo ritmo por 90 minutos. Passada a primeira metade da
etapa inicial os brasileiros já haviam compreendido os atalhos para sufocar a
defesa russa e, assim, impedir que o avanço em blocos herméticos
desestabilizasse o sistema tático que tanto deu certo contra a Itália. Mesmo
assim, pela primeira vez a nossa Seleção encontrou um adversário com vigor
físico compatível e frieza para esperar o momento certo de partir para o
ataque.
O jogo dessa tarde de segunda-feira fez lembrar o jogo
Assisense 0x3 Itararé, em 2004. Vínhamos de uma série invicta, atropelando a
tudo e a todos pela Série B-2 do Campeonato Paulista. O Assisense era
excessivamente técnico, além da média da última divisão do Paulista. E o
Itararé vinha de um grupo que na primeira fase teve somente um time que se
destacava: ele mesmo. Era o melhor do campeonato, seguido pelo Assisense. E
aqui, em pleno Tonicão, o Assisense levou uma bordoada.
A Rússia de hoje foi o Itararé de 2004. Fazíamos mais faltas
e quando derrubados nem falta era assinalada. Os russos são muito fortes. E vez
em quando a força prevalece sobre a técnica. Recordemos a Espanha campeã da
Europa antes da Copa de 2010. Enfiou 4x0 na Itália técnica, de toque refinado.
O futebol espanhol não é dos mais bonitos, mas sobressai a partir de uma força
físico-tática que destrói sistemas táticos do estilo 4-4-2, que necessariamente
tem de passar para o 4-2-3-1.
Felipão voltou para o segundo tempo com a teimosia que lhe
fez de técnico campeão do mundo em 2002 a técnico de rebaixamento em 2012: sem
alterações. Quando mudou, colocou Hulk. Ótimo, eu também faria a mesma
alteração, pois com Fred e Hulk na frente tínhamos condições de brigar, nem que
fosse no braço, com a fortaleza russa. Neymar, não tem jeito, continuará
fazendo portfólio para concorrer a algo na Fifa, nos finais de ano, contra
Botafogo de Ribeirão Preto e outros nanicos. Quando encara as linhas de defesa
europeias, o máximo que faz é tocar a bola para o lado ou, se houver brecha,
comprovar o egoísmo que lhe é peculiar.
E por falar em Neymar, hoje, enfim, ele jogou em um estádio
onde poderia estar pisando toda semana há pelo menos 3 anos. Foi na casa do
Chelsea, que chegou a oferecer 37 milhões de euros pelo metrassexual magrelo
brasileiro, que a bola rolou entre Brasil x Rússia, hoje. Neymar, que alguns
semestre atrás era visto como ídolo em Londres, hoje foi vaiado em lances de
simulação de falta recebida e cotovelos lançados nos rostos de seus marcadores.
E, de novo, não fez absolutamente nada que ajudasse a reverter a situação
permanentemente desfavorável ao Brasil nos 90 minutos.
O gol dos russos fez lembrar aquelas peladas entre Solteiros
x Casados, Calouros x Veteranos ou, ainda Vida-que-segue x Vida Loka. Júlio
César viu tanto a bola ir e vir que, zonzo, quando ela foi pra cima dele, ele
pulou e quase gritou “joga sal que é sapo!”. Gostaria que o técnico russo
mostrasse, na coletiva, nesses quadros que simulam as linhas do gramado, o
sistema tático que, treinado, originou esse único gol de sua seleção. Para
configurar o desespero russo pelo gol talvez, numa aproximação em zoom a imagem
mostre, em algum canto, o goleiro deles dentro da área naquele momento do gol.
Mas, Felipão tinha uma carta na manga. Claro, a solução de
todos os problemas estava na entrada do jogador sensação do momento. Diego
Costa mandou Kaká para o lugar de onde ele nunca deveria ter saído: o banco. E
esse “ele” a que me refiro não é só Kaká. É, também, Diego Costa. Afinal, de
onde surgiu esse cara? Já perguntei a meu amigo Luiz Jünker, de Caxias do Sul,
se o rapaz é frequentador de saunas por lá. Parece-nos que não. Tentei
relacioná-lo ao sobrenome Marin ou Del Nero, mas também não encontrei nada.
Família Costa é tradicional em Portugal, Felipão já treinou a seleção
lusitana... bom, seja lá qual for a origem dessa convocação, que fique por
aqui. Ou melhor, por lá mesmo, em Londres, pois por aqui nem mesmo a família
Costa pode reconhecê-lo.
O impossível aconteceu no final e, convenhamos, foi um
castigo para os russos. Eles chegaram com muito mais frequência ao gol de Júlio
César do que nosso ataque em relação à defesa adversária. A comprovação da
injustiça do resultado está na falta cobrada por Hernanes nas proximidades da
grande área. David Luiz e todos os jogadores mais altos foram para a grande
área, mas Hernanes, tal qual Neymar, quis fazer tudo sozinho, jogando a bola
metros acima do gol russo. E quem construiu o lance dessa cobrança de falta?
Hulk, que por mais 30 centímetro teria sofrido pênalti. Penalidade que, por
sinal, seria disputada a tapa para a cobrança, pois parece-me que nem isso a Seleção
de Felipão treina nem decide previamente.
Hulk, pelo mesmo lado esquerdo, foi ao fundo e, respirando
por aparelhos, fez o cruzamento perfeito para Fred bocejar, ou melhor, grita “gol”.
Centroavante é isso, ou seja, tem de estar lá no lugar certo, é perseguido pela
bola e pode passar 90 minutos apagado para acender durante fração de segundos.
Jeito à altura de definir esse futebol medíocre da Seleção, um grupo comandado
por um técnico fraco, teimoso e que, na incoerência que lhe é peculiar, declara
convocação de Ronaldinho Gaúcho, há algumas semanas descartado pelo baixo
aproveitamento na oportunidade recebida e agora negociado para salvar um
meio-de-campo que ora produz só durante 45 minutos, ora não produz nada durante
90 minutos.
Gostaria de ver com a mesma frequência dantes a cara do
senhor José Maria Marin, o surrupiador de medalhas da Taça São Paulo. Na fase
de degola de Mano Menezes esse senhor aparecia mais que o comandante do
futebol, metendo o dedo onde não devia. Esse cidadão demitiu Mano sem motivo
sólido e anunciou Felipão para comandar jogos contra Seleções de verdade. Hoje,
o Felipão de Marin quase perdeu para a Rússia, que nunca disputou um título de
Copa do Mundo. Minha expectativa, agora, é ver a Seleção de Felipão enfrentando
a Argentina no tal do Super Clássico das Américas, confronto que pelo nome deveria
ser disputado ou num sábado pela manhã ou no intervalo do Esporte Especular.
Não desmereço o futebol dessa Seleção que, reconheço, tem seus
méritos. O que não entendo é o ponto em que o time de Felipão difere, para
melhor, do time de Mano. Estamos às vésperas da Copa das Confederações e já
surge o discurso de que o objetivo não é necessariamente o título, mas o
entrosamento que leve a uma disputa, em 2014, pela condição de campeão em casa.
Entrosamento por entrosamento, Mano Menezes recebeu da CBF a incumbência de
promover a renovação do futebol brasileiro pós-Dunga. Os melhores jogadores do
enredo nacional na atualidade surgiram com Mano: Oscar, David Luiz, Neymar,
Lucas, Marcelo e Hulk. À exceção de Neymar, os demais eram anônimos na era
Dunga e com Felipão continuam com o potencial limitado pela teimosia Felipiana
de jogar na retranca e/ou segurar resultados. Não por acaso, Felipão sorriu,
satisfeito, quando o árbitro encerrou o jogo de hoje.
*Professor universitário, historiador e jornalista, é mestre em Ciências da Comunicação pela ECA/USP.
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