01 MAIO 2013
Cláudio Messias*
No dia 2 de outubro do ano passado eu sentei na cadeira 37,
fileira 9, do Estádio da Luz, bairro Benfica, em Lisboa, Portugal. Tive o
privilégio de ver Benfica 0x2 Barcelona. Apenas ouvi falar, mas não vi Pelé e
Eusébio jogarem. Assisti, pela TV, Maradona e Zico. Ao vivo, in loco, contemplei
Ronaldo e Rivaldo. Em Lisboa, vi Messi. E só esse último basta. O argentino é
fenomenal.
Minha estada em Portugal tinha por objetivo apresentação de
trabalho científico no VI Lusocom, evento que reúne pesquisadores de países de língua
portuguesa cujas investigações estejam centradas nas Ciências da Comunicação.
Soube do jogo através de Sapinho, apelido de Wesley, um garçom brasileiro
nascido em Birigui/SP e que há 12 anos ganha a vida em Lisboa.
Comia, eu, um bolinho de bacalhau, tomava uma cerveja,
jogava conversa fora com Sapinho e, falando de futebol, fui perguntado se
aproveitaria a viagem para ver o Barça. Estava no Belém, bem em frente à
tradicional casa que há mais de um século fabrica os pasteizinhos homônimos. Eu
e o garçom temos doença em comum: a paixão pelo Corinthians. E descobrimos
outra afinidade concomitante: o apreço a Messi.
Recebi de Sapinho a orientação para pegar o ônibus da linha
com destino ao shopping Colombo, que fica ao lado do Estádio da Luz. Lá,
procurei Soraia, funcionária que atendia na loja oficial do Benfica, no
estádio. Segui o trajeto no dia seguinte, entusiasmado e esperançoso, pois era,
já, sexta-feira e o jogo ocorreria na terça-feira seguinte. Na boca de todos,
não haveria mais ingresso. Soraia, contudo, tinha, sim, 5 últimos ingressos à
venda. Paguei os 35 euros estabelecidos no tíquete pela UEFA e garanti meu
lugar naquele que seria, até então, o evento esportivo mais importante de minha
história de espectador.
Sentei a 10 metros do gol de entrada do estádio. Foi ali, a
menos de 15 metros de distância, que Messi foi à linha de fundo e cruzou a bola
para o primeiro de dois gols do Barça. Naqueles 90 minutos o time catalão ficou
com a bola durante impressionantes 76% do tempo total. A ponto de, no segundo
tempo, ter dado, acredite, sono. Bocejei e cheguei a perceber detalhes
coadjuvantes ao espetáculo, como, por exemplo, a nuvem de fumaça que cobria o
estádio. Fumaça de cigarros, pois português, assim como os europeus como um
todo, fumam feito caiporas.
O sistema tático do Barcelona continuava a impressionar o
mundo, mesmo após a saída do técnico Pepe Guardiola. Seu sucessor manteve o
sistema tático, mas a eficácia, visivelmente, era técnica. Aquele time, muito
mais do que depender de Messi, tinha um sistema em que os laterais avançavam e
os zagueiros davam cobertura pelas extremidades, ao passo em que dois volantes
fixos fechavam pelo meio, cobertos pelos dois meias, pela direita e pela
esquerda. Assim, Messi poderia receber a bola tanto de Iniesta quanto de
Mascherano, por exemplo, pois o time chegava ao ataque em blocos. Se a bola fosse
perdida, imediatamente haveria cobertura do setor em que isso ocorresse, não
sobrando opção de passe por parte do jogador adversário com a posse da bola.
Tentei encontrar o sistema tático do Barcelona de Tito
Villanova, mas não consegui. Ora era um 4-4-2, ora era um 3-5-2, ora era um
surpreendente 3-3-3-1. A inversão de lado dos laterais, assim como dos volantes
e dos meias deixava o Benfica perdido, pois seus marcadores eram ou destros, ou
canhotos. Só um time de outro mundo tem 10 jogadores ambidestros. O Barcelona
tem.
Aquele Barcelona já não estava na final do Mundial de Clube
porque ficara na lista de vítimas do Chelsea na mesma UEFA Champions League,
temporada 2011/2012. Era prenúncio de que as coisas continuavam dando certo no
supérfluo, mas não no bojo. O jogo contra o Benfica era só o primeiro turno da
primeira fase da Copa dos Campeões. E mostrava um Messi que deslizava.... quase
pairava em campo. Impressionante como aquele baixinho não caía, grudava a bola
aos pés e via, pela nuca, seus companheiros de equipe deslocando-se pelo tapete
verde.
Hoje, em casa, o Barcelona comprovou que estava tudo errado.
Algo aconteceu nos últimos 12 meses, e não foi só agora. E também não foi a
saída de Guardiola. Iniesta já não tem o mesmo fôlego, a zaga depende demais da
presença, nem que seja psicológica, e não física, de Puyol, e Messi parece ter
incorporado a condição de terráqueo. Todos os sistemas táticos e técnicos que
vi contra o Benfica não funcionaram frente ao Bayern. Claro, os alemães
assistiram detalhe a detalhe todos os jogos da história recente dos espanhóis.
E, não tenho dúvidas, o criador revelou a criatura.
Guardiola assume o Bayern terminada a temporada europeia. Ou
seja, os alemães, caso cheguem à decisão do Mundial, em dezembro, serão
comandados por outro xerife. Assumirá quem criou o maior monstro do futebol
contemporâneo. Não tenho dúvidas, pois, que ele mesmo, Guardiola, forneceu o
antídoto.
Sapinho é de Birigui e há 12 anos trabalha como garçom no Belém,
em Lisboa: dica para comprar ingresso veio dele
Messi, nas minhas lentes; pessoalmente, ele é
mais baixinho do que eu imaginava.
Chegada ao Estádio da Luz e o início de torcida pelo Benfica,
meu time português do coração
Fiquei a 10 metros do gol de entrada do estádio; ali saiu o primeiro
gol do Barça, em cruzamento de Messi
*Professor universitário, historiador e jornalista, é mestre
em Ciências da Comunicação pela ECA/USP.
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