Cláudio Messias*
Sexta-feira, final de tarde e um diálogo, nas redes sociais, combinando churrasco entre profissionais que atuam na imprensa do Médio Vale. Jeferson Galvão, repórter de uma emissora de rádio de Cândido Mota, anuncia que vai ao evento, porém não beberá. Claro que ele não referia a água, refrigerante ou ao líquido da piscina. Condutor habilitado de veículos, o repórter anunciava abrir mão do consumo de bebidas alcoólicas por um simples detalhe: o local de realização da confraternização ficava entre Assis e Paraguaçu Paulista, uma chácara, e, portanto, para chegar e para sair de lá seria necessário transitar por rodovia.
Achei interessante a posição de Jeferson Galvão, uma vez que ele próprio acompanharia, in loco, nas horas seguintes àquele diálogo de colegas de imprensa nas redes sociais, a um desencadear de verdadeiras tragédias que abarrotariam as manchetes de sites, rádios e emissoras de TV nessa segunda-feira. E, parece não ter jeito, se há acidente cujas circunstâncias envolvidas surpreendem, lá tem um sujeito alcoolizado entre feridos ou mortos. A morte parece bater cartão entre o entardecer das sextas-feiras e o anoitecer dos domingos, ficando escondida atrás das porteiras que dão acesso ao número galopante de chácaras nos arredores da Sucupira do Vale.
Com compromissos em Bauru no domingo, tive de dedicar o sábado a preparativos. Fiquei, logo, só na vontade de ir à confraternização da imprensa. Fui ao supermercado, comprei, entre outros artigos, a cerveja em lata que consumiria em casa e, na fila do caixa, fiquei surpreso com o conteúdo dos carrinhos que estavam ao lado. Um grupo de aproximadamente 10 jovens e muita, mas muita bebida alcoólica. Moços e moças com garrafas long neck de cerveja e litros de uma variedade que ia da popular cachaça a uísque. Era 11 horas da manhã daquele sábado e como as duas filas, quais sejam, a minha e a desse grupo, andaram praticamente juntas, juntos saímos para o estacionamento. Entrei no meu carro, eles nos deles. Estavam em dois veículos e ao passo em que eu segui pela avenida Dom Antonio sentido centro, eles foram em direção ao bairro. Logo, deduzo, sairiam da cidade para alguma festa regada a muita, mas muita bebida alcoólica, uma vez que não vi refrigerantes entre os líquidos adquiridos pelo grupo.
Já no domingo, eu retornava de Bauru pela SP-294, a Comandante João Ribeiro de Barros. Era por volta de 17 horas e no trecho de 176 km Bauru>Marília>Assis levei três 'fechadas' de veículos cujos condutores adentraram à pista sem sinalizar e desrespeitando que havia - no caso, eu - quem viesse em trânsito. À base da direção preventiva, reduzi a velocidade, fiquei atrás desses três inconsequentes e, claro, em questão de minutos meu veículo, que trafega dentro dos limites de velocidade estabelecidos, ficou para trás de dois deles. Perdi de vista os tais condutores irresponsáveis.
Antes disso tudo acontecer dei uma parada pouco depois de Bauru, já na SP-294. Usei o banheiro, comprei duas garrafas de refrigerante para tentar amenizar o calor e resfriar metaforicamente a cabeça do filho que acabara de fazer prova pela primeira fase do vestibular da Unicamp, e segui viagem. Não sem antes perceber que lá, na lanchonete à beira da estrada, havia muitos grupos de jovens, provavelmente vindos de outras localidades e com a mesma finalidade de vestibulandos. Todos consumiam latas de cerveja. Vi aquilo, ignorei e saí. No caixa, comentei com a funcionária sobre a empolgação do grupo com a bebida. E ouvi a explanação: "todo final de semana é assim; eles vêm, enchem a cara e vão embora".
De volta à estrada, não mais que 20 minutos depois tive o veículo ultrapassado por um grupo, em alta velocidade. Eram pelo menos 5 outros automóveis, que igualmente desapareceram à minha frente naquelas pistas duplicadas que estabelecem o limite de trânsito a 110 km/h. Será que preciso dizer que quem estava no interior daqueles automóveis eram os mesmos jovens que vi quilômetros antes na lanchonete? Em um dos carros, inclusive, uma moça que acompanhava o motorista exibida a dourada cor da lata de cerveja que portava nas mãos.
Próximo a Garça tive de dar a primeira freada brusca, de maneira a evitar colisão traseira com um sujeito que arbitraria e inconsequentemente colocou seu automóvel Escort na pista de rolamento sem respeitar o trânsito. Naquele momento eu era ultrapassado por outro veículo, ou seja, não tinha o recurso de desviar para a faixa da esquerda da rodovia duplicada. Para bom entendedor, questão de 5 segundos ou menos e eu teria colidido na traseira desse infeliz que aparentemente transportava a família inteira e saía de uma estrada de terra com característica de acesso a chácaras nos arredores de Garça.
Antes da baixada do Rio do Peixe, pra frente de Marília, já na SP-333, um Voyage desgastado pelo tempo, também lotado, repete a infração, mas de maneira ainda mais irresponsável. O condutor cruza as duas pistas e entra na minha mão de direção, no mesmo sentido Marília>Echaporã. Minha frenagem acorda o filho vestibulando que cochilava e descansava do cansativo domingo de prova e viagem. Como havia fluxo de veículos no sentido contrário, fiquei atrás dele alguns minutos a incríveis 40 km/h. Voyage lotado de adultos e crianças e um condutor visivelmente fora de condições de estar ao volante. Procedi a ultrapassagem já chegando a Echaporã e fiz questão de observar o condutor. E não tive mais dúvida sobre sua sobriedade.
A terceira invasão de pista conseguiu ser pior do que essas duas já narradas. Um Pálio seminovo saiu do primeiro posto à esquerda, depois de Echaporã, cruzou a pista da SP-333 e ficou à minha frente no sentido Echaporã>Assis. Mas, não daria tempo de eu frear, pois meu veículo estava a menos de 100 metros do posto quando o invasor saiu, veja só, na contra-mão, pela alça de acesso, vindo de frente conosco. Lendo assim, e imaginando, você, raro e exceto leitor, deduz que ele, o condutor, percebeu o que estava fazendo e parou. Mas, não. Ele virou bruscamente na pista, tirou as rodas da direita do asfalto, foi ao acostamento e voltou. Quando viu que eu colidiria com a traseira de seu carro lotado de passageiros, saiu para o acostamento e, pasmem, quase atingiu outro veículo que havia acabado de sair do mesmo posto, porém respeitava o momento de aguardar com segurança fora da pista.
Daquele ponto até Assis esse Pálio ficou atrás de meu veículo até entrar na cidade, durante algo em torno de 15 quilômetros. Segui pela José Nogueira Marmontel e na rotatória ao lado da igreja Redonda ele, o outro condutor, virou à esquerda, sentido Parque das Flores. Ainda comentei com meu filho que por estarmos transitando na rodovia a menos de 80 km/h e todos os demais usuários estaremos nos ultrapassando, aquele condutor do Pálio não nos passou por vergonha do que fez saindo do posto. Meu filho, que tem 16 anos, sabiamente complementou com outra hipótese. "Ou, ele não está em condições de efetuar uma ultrapassagem". Fiquei com a segunda opção.
Aí você pensa que entrei na cidade e esses três episódios que supostamente envolvem bebida e volante encerraram meu domingo de causos para contar. Estás enganado. Minutos depois, na mesma José Nogueira Marmontel, reduzindo a velocidade em frente à floricultura Estela D' Alva, ficamos atrás de um caminhão. De repente, o condutor do veículo coloca-se ao lado de um Voyage prata, desses novos, cuja condutora aguardava a liberação do trânsito na rotatória para avançar. A lateral do caminhão passa a centímetros do Voyage e as rodas esquerdas sobem a guia e atingem não uma, mas duas placas de sinalização. Ficamos, todos, paralisados e sem entender nada. A condutora do Voyage, coitada, parece ter ficado em estado de choque, assustada com o que quase acontecera com a lateral de seu veículo.
Retomado o trânsito, o Voyage seguiu pela José Nogueira Marmontel e eu, virei para a avenida Glória. E percebi que o condutor do caminhão havia estacionado. Quando passei por ele, vi que sua preocupação maior nada era relacionada ao estrago que fez ao patrimônio público destruindo as duas placas de sinalização. O que ele fazia, mesmo, era verificar se havia algum tipo de avaria em seu caminhão, cujas placas eram de Pedrinhas Paulista. Voltou para o veículo e saiu como se nada tivesse acontecido, transitando a uma velocidade mínima, pela Dom Antônio e depois descendo igualmente lento pela André Perine, sentido Vila Operária.
Das quatro circunstâncias, a que mais me assustou aconteceu dentro de Assis. Houvesse uma pessoa na calçada ali, em frente ao restaurante que funciona nas imediações da rotatória que converge José Nogueira Marmontel e avenida Glória e teria ocorrido um atropelamento. O caminhão simplesmente não parou, deixando dúvidas se faltou freio, sobriedade ou os dois juntos.
Não posso, aqui, dizer que todas as circunstâncias que relatei foram provocadas por embriaguês ao volante. Mas, isso não anula a preocupante constatação de que apesar do vigor, desde 2008, da Lei Seca, principalmente os jovens continuam consumindo bebida alcoólica e saindo para as rodovias. A situação, de tão estapafúrdia, mostra um grave acidente na avenida Armando Sales de Oliveira, dentro de Assis, em plena segunda-feira, tendo o veículo uma pesada carga de bebidas alcoólicas em seu interior. Ou seja, enquanto líamos as manchetes dos acidentes de trânsito registrados no final de semana havia condutor, com suspeita de embriaguês, batendo em poste dentro da cidade em plena segunda brava.
Consulto a página do site Assiscity e nesse momento, agora mesmo, vejo estampadas 8 manchetes relacionadas a acidentes de trânsito. Entre eles, o da Armando Sales. Colisões efetivamente registradas, com ou sem mortes. Já imaginou se tivéssemos condições de transformar em estatística a quantidade de 'quases' como os 4 que testemunhei no intervalo de apenas duas horas nesse final de domingo? Ou seja, se morreram seis ou oito pessoas em circunstâncias que envolvem consumo de álcool e trânsito, imaginemos quantos cidadãos poderiam ter morrido em circunstâncias iguais, ficando na base do 'quase'!
O problema existe e parece estar longe de uma solução. Pessoas morriam antes da Lei Seca, e continuam morrendo em circunstâncias envolvendo embriaguês ao volante. Ouvem-se relatos de filhos de pobre, filhos de ricos e até filhos de policiais e autoridades do gênero que ou assumem o volante fora da idade mínima permitida ou simplesmente bebem e conduzem seus veículos sob a certeza da impunidade.
Piada por piada, que fiquemos com a imagética. Afinal, pelo jeito, para pôr um fim a isso, aparentemente, só no dia em que os veículos saírem de fábrica com um dispositivo que só acione o motor mediante aferimento da dosagem de substância etílica. Tem bafo de álcool, no carro não funciona. Mas, se isso não existia nem no mundo dos Jetsons, dos desenhos animados, quiçá nos tempos em que seguro, mesmo, é o dono da carroça, que mesmo bêbado é conduzido em segurança pelo cavalo que sabe o caminho e, se duvidar, olha para os lados para atravessar a pista.
*Professor universitário, historiador e jornalista, é mestre em Ciências da Comunicação pela ECA/USP.
2 comentários :
Claudio Boa Tarde!
Leio sempre seus artigos. Tenho algo aqui comigo que você mencionou tempos atrás num texto bem saudosista que gostaria de te passar. Poderia me informar seu endereço para que eu possa mandar pelo correio?
wagner_astel@hotmail.com
por que nao escreve mais)
Abraco
Adilson
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